Um grupo seminal do pós punk, tidos como os "fundadores" do rock gótico. Uma banda que também ultrapassava os limites desses estilos. Um nome essencial para entender toda a efervescência criativa dos anos 80. Simplesmente Bauhaus.
Formado em 1978, em Northampton - Inglaterra, o grupo era composto por Daniel Ash (guitarra - o mentor do projeto), Peter Murphy (vocal) e os irmãos David J (baixo) e Kevin Haskins (bateria). O nome da banda faz referência ao revolucionário estilo de design (odiado pelos nazistas) lançado pelo arquiteto alemão Walter Gropius, em 1919 (aliás, o primeiro nome da banda foi Bauhaus 1919). Isso deu ao grupo um certo charme cult e uma misteriosa aura artística que também sugeria uma ligação com a decadência da Berlim da década de 1920. A escola Bauhaus também era tida como um desenvolvimento do Expressionismo. O estilo Bauhaus era associado com os artistas expressionistas que fizeram a iluminação e os cenários de filmes de horror alemães, como "O Gabinete do Dr. Caligari" e "Nosferatu". E foi a estética desses filmes que serviu de combustão para formar a alma e a identidade do Bauhaus. Sem saber, a banda estava lançando todo um legado.
No link abaixo, vídeo de um dos primeiros shows do Bauhaus, em janeiro de 1979:
"The shadow is cast".
O grupo foi "acusado" pela imprensa musical de tentar "ressuscitar" o glam rock, com toda sua teatralidade e androginia. Os críticos também os via como sombras pálidas de dois ícones considerados sagrados pelos jornalistas do rock britânico: O Bowie da década de 1970 e o punk rock. É claro que eles eram influenciados por David Bowie - a maioria das bandas do fim da década de 1970 e do início de 1980 tinha uma dívida criativa com Bowie - e pelo punk rock. Mas o Bauhaus agregou outros ingredientes variados e exóticos em sua alquimia sonora, criando uma infusão única (Goth Chic, 2006).
Em 1979, eles lançaram o single "Bela Lugosi's Dead". Curiosamente, a capa original não traz uma cena de Drácula e sim uma cena de "The Sorrows of Satan" (um filme mudo de 1925).
A faixa homônima - um tributo ao ator Bela Lugosi e sua aclamada interpretação de Drácula (1931) - é cheia de efeitos que simulam o som de asas de morcego batendo. Traz ainda um baixo sombriamente minimalista, microfonias de guitarra, uma bateria repetitiva e marcante, além de um vocal deliciosamente dramático. Assim é a canção em seus quase dez minutos: sombria e misteriosa. O cartão de visitas perfeito para o Bauhaus (ironicamente, os músicos também apontaram inspirações da brasileiríssima e ensolarada bossa nova na construção da música). Atualmente, existe um consenso de que esse foi o primeiro rock gótico lançado. Um verdadeiro hino! Após isso, o grupo assinou com a 4AD. Foi o primeiro grande lançamento da gravadora que depois se tornaria um dos selos alternativos mais elegantes daquele tempo, lançando nomes como Dead Can Dance, Cocteau Twins e Clan of Xymox. Em 1980, mais três singles foram lançados: "Dark Entries", "Terror Couple Kill Colonel" e "Telegram Sam". Mas o melhor ainda estava por vir, com o lançamento do primeiro álbum.
Um barril de pólvora incendiário, repleto de ritmos irregulares, letras ácidas e vocais descontrolados. Lançado em 1980, "In The Flat Field", vai além do que o quarteto já havia apresentado em seus singles de estreia. Em suas 9 faixas, esse álbum se mostra intenso, diversificado e coeso. Uma aula de simplicidade e crueza, sem soar banal. Destaque para os petardos sonoros: Double Dare e In The Flat Field; entre outras músicas marcantes como a contundente God In An Alcove, a enigmática Spy In The Cab, o tributo agonizante a Stigmata Martyr e o nervosismo crescente de Nerves. Essencial!
Em 1981, agora pela gravadora Beggars Banquet, foi lançado o segundo álbum: "Mask". Considerado por muitos o auge da banda, é também o álbum mais gótico da discografia do grupo. Apresenta um grupo mais maduro e um excelente repertório. As letras, dramáticas, também merecem destaque. Apesar de algumas faixas mais acessíveis, a atmosfera continua densa e o espírito criativo e artístico do pós punk cada vez mais pulsante. Repleto de faixas antológicas como o réquiem das paixões trágicas Passion of Lovers e o hino deliciosamente soturno Mask; além de outros destaques como a obscura Hair of the Dog, a profunda Hollow Hills, o swing de Kick in the Eye e a contagiante The Man With The X-Ray Eyes.
O vídeo clipe expressionista de Mask - em nossa opinião, o melhor do Bauhaus. Clássico!
Em "Sky's Gone Out", lançado em 1982, nota-se um trabalho diferente dos anteriores, mais eclético e ousado. Claramente o grupo atingia o seu pico experimental. Como disse um crítico muito sagaz: "Se o gótico e a psicodelia se casaram em algum matrimônio profano, essa seria a marcha nupcial". Destaques para o cover de Brian Eno em Third Uncle, a insana Silent Hedge, a catarse teatral de Spirit, o épico progressivo em três partes The Three Shadows, a melancolia ao violão de All We Ever Wanted Was Everthing e a experimental Exquisite Corpse. Para ser ouvido sem preconceitos.
O single de Ziggy Stardust, lançado no mesmo ano, foi o maior sucesso comercial do grupo. Esse cover de David Bowie traduzia aquilo que o Bauhaus chamava de "Dark Glam".
Em "Burning from the Inside", lançado em 1983, as experimentações prosseguiram. Mas o grupo já demonstrava sinais de esgotamento. O fim da banda era iminente e inevitável e, de certa forma, isso já estava se refletindo na música. Independente disso, o disco tem bons momentos e merece atenção. O destaque maior fica para a inesquecível She's in Parties. A ótima Antonin Artaud reverencia outra forte inspiração da banda (o dramaturgo do Teatro da Crueldade). Além delas, também destacaria a delicada e meio spoken word Who Killed Mr.Moonlight? (na voz de David J) e Slice of Life (na voz de Daniel Ash). As ótimas Lagartija Nick e Sanity Assassin, que sairam em single, também merecem citação.
Logo o grupo se dissolveria por completo. Dizem que o estopim da separação do Bauhaus foi a participação do grupo no filme The Hunger (Fome de Viver). Peter Murphy se tornou o centro das atenções à custa dos outros membros, que foram praticamente excluídos da cena em que participam. Existem muitas especulações em torno do término da banda - inclusive dois livros abordam esse tema: a biografia "Dark Entries", de Ian Shirley e "Who Killed Mister Moonlight?", escrito pelo ex-baixista David J. Mas não nos interessa aqui discutir os motivos do término da banda, talvez apenas lamentar...
Com o dissolvimento do Bauhaus, todos seguiram outros projetos, dos quais faremos um apanhado geral:
O Tones on Tail, formado em 1982, inicialmente era um projeto paralelo de Daniel Ash com seu amigo e rodie do Bauhaus, Glenn Campling. Com o fim do Bauhaus, o baterista Kevin Haskins juntou-se ao grupo. Lançaram apenas um álbum: Pop (1984) e alguns compactos.
Com muitas músicas instrumentais, o som do grupo é uma mistura de post punk, pop rock, rock alternativo e alguns flertes com o rockabilly. Um crítico os definiu com maestria: "doom-and-dance-pop". Com apelo dançante e mantendo em algumas faixas a atmosfera dark do Bauhaus, é um grupo bastante apreciado pelos góticos.
Destaques para o maior dos hits, Go, além de outras úsicas de igual potencial como Burning Skies, Lions e Performance (minhas preferidas).
Em 1985, após o término do Tones on Tail, Daniel Ash, Kevin Haskins e David J. criaram o Love and Rockets. Basicamente, era o Bauhaus sem o Peter Murphy. Mas o grupo afastou-se progressivamente dos temas obscuros e do pós punk, ficando mais acessível ao grande público. O som também é diversificado, fundindo rock alternativo e psicodelia com elementos da musica pop (os últimos lançamentos também apresentam uma sonoridade mais eletrônica). O resultado foi uma melodia envolvente, popularidade entre os "indies" da época e sucesso comercial. Lançaram sete álbuns e vários singles.
Destaque para o sucesso So Alive e outras faixas como Ball of Confusion, Kundalini Express e No New Tale To Tell.

O Dalis Car foi formado em 1984, por Peter Murphy e Mick Karn (ex integrante do grupo Japan). Lançaram apenas um disco: The Waking Hour (1984). A base do som era constituída por teclado e baixo e apresentava um forte apelo experimental. Após anos de hiato, a dupla ainda lançaria um EP em 2012, no último suspiro dessa aventura pouco explorada chamada Dalis Car.
Destaques: The Judgement Is The Mirror, Cornwall Stone, Create and Melt e Sound Cloud.
Daniel Ash, David e Kevin dando um rolê e fazendo um som pela cidade, vestidos de... abelhas (???).
Esse foi o The Bubblemen - "projeto paralelo" do Love & Rockets. Lançaram 1 single em 1988.
Esse foi o The Bubblemen - "projeto paralelo" do Love & Rockets. Lançaram 1 single em 1988.
Após a aventura experimental do Dalis Car, Peter Murphy lançou-se em carreira solo e alcançou o mesmo sucesso comercial de seus ex-companheiros de Bauhaus. Até o momento foram 10 discos lançados (considerando somente os de inéditas) e alguns reconhecidos sucessos, como: All Night Long, Indigo Eyes, Cuts You Up e A Strange Kind of Love.
É importante destacar ainda a pouco comentada carreira solo de Daniel Ash. Com 3 discos lançados, ele explora novos horizontes, como a chill-out, o dreampop e nuances eletrônicas, fazendo uma música que esbanja elegância e sensualidade. David J também traçou uma interessante carreira solo, explorando o jazz e outros ritmos intimistas, com colaboração de vários artistas como a pianista Jill Tracy e o quadrinista Alan Moore.
Durante a "hibernação" do Bauhaus, o grupo até chegou a se reunir algumas vezes, mas sem lançar nenhum material inédito. Em 1999, houve uma aguardada turnê registrada no DVD Gotham. E em 2008, após 25 anos sem inéditas, o Bauhaus finalmente se reuniu para lançar Go Away White. O disco comprovou que o grupo ainda tinha fôlego.
Apesar de distante do pós punk oitentista, o álbum traz um som renovado e moderno. É um rock cru, direto e bem executado por músicos experientes e seguros. Mesmo longe da minha fase preferida, mata a saudade. Destaques: Adrenaline, Endless Summer of the Damned, Black Stone Heart e The Dog's A Vapour.
Apesar de distante do pós punk oitentista, o álbum traz um som renovado e moderno. É um rock cru, direto e bem executado por músicos experientes e seguros. Mesmo longe da minha fase preferida, mata a saudade. Destaques: Adrenaline, Endless Summer of the Damned, Black Stone Heart e The Dog's A Vapour.
Bauhaus e o Gótico: Ainda que, com frequência, tenham rejeitado a "pecha" de góticos, é inegável que o Bauhaus esteve profundamente imerso nesse universo e seja considerado um dos "pais" do estilo. As referências traduzidas na sonoridade e no visual, além da performance, serviram de base propulsora para muitas bandas que surgiriam a seguir e também de inspiração para um emergente publico que consolidaria a identidade da moderna subcultura gótica. Um nome básico.
Matéria: Guilherme Freon
Fontes:
4AD - Site
Dark Entries - Livro
Goth Chic - Livro
Post-Punk.com - Site
Wikipedia - Site
Arquivo Pessoal Freon
ÁLBUNS DISPONÍVEIS:
Fontes:
4AD - Site
Dark Entries - Livro
Goth Chic - Livro
Post-Punk.com - Site
Wikipedia - Site
Arquivo Pessoal Freon
ÁLBUNS DISPONÍVEIS:
A definição de "som dos anos 80" encontra sua expressão mais pura no gótico. Imagem também: limpa, depurada, asséptica, teatral, brilhante e sombria. Quase inumana, até artificial. E no entanto, belíssima em seus tons de azul metálico. Para o bem ou para o mal, Bauhaus.
ResponderExcluirPuta que Pariu! Bauhaus - Ziggy Stardust --- um caso raíssimo de uma cover de um clássico que SUPEROU o original "cartão de visitas pessoal". Porra, o David Bowie deve amar e odiar esses caras com a mesma intensidade. O baterista Kevin Haskins poderia destruir um planeta! E o magnífico Peter Murphy canta expelindo até a última gota de sangue, numa interpretação EXTREMA, muito mais passional do que o Camaleão. Parabéns, rapazes! Vocês são foda! BAUHAUS FOREVER!
ResponderExcluirO mais divertido é reparar como o Peter Murphy consegue ser um David Bowie melhor do que o próprio David Bowie... com a elegância fria, sofisticada e finíssima de Byan Ferry mais a selvageria animalesca de Iggy Pop, se contorcendo no palco com o dorso nu, totalmente feroz e fora de controle. Ele sugou tudo de melhor dos astros antigos e explodiu como uma supernova. O cúmulo da ironia é assistir Peter Murphy roubando a cena, cantando o clássico dos Bauhaus Bela Lugosi's Dead na sequencia dos créditos de abertura de Fome de Viver, o filme mais "anos 80" da década de 80, estrelado por David Bowie e Catherine Deneuve no papel de um casal de... vampiros.
ResponderExcluirMeu velho, eu enviei VÁRIOS artigos ilustrados meus sobre Cultura Pop e Bandas de Rock Gótico para o seu e-mail : gothicsongs@hotmail.com
ResponderExcluirRecebido, Ernesto. Obrigado, muito legal!
ResponderExcluirAnos 80 tempo bom que se foi.
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